Nesta quinta-feira, 17, a terceira edição do Concurso de Beleza Negra celebrou a cultura de resistência e a herança ancestral da população preta da Barra dos Coqueiros. Em um evento marcado pela afirmação e valorização da negritude de crianças, adolescentes e adultos barracoqueirenses, a Prefeitura do município enalteceu a percepção estética, o respeito e a visibilidade da beleza negra.
Realizado através da Secretaria de Assistência Social, por meio da Centro de Referência de Assistência Social - CRAS, juntamente com o Departamento de Promoção da Igualdade Racial – DEPIR, e Secretaria Municipal da Cultura, o concurso reuniu participantes com faixa etária entre 10 a 29 anos, divididos em categorias. Além de celebrar o Dia da Consciência Negra, comemorado em 20 de novembro, o evento fez uma homenagem a Lélia González, ativista e intelectual negra.
A diretora do Departamento de Igualdade Racial, Aline Regina Conceição, avaliou o concurso como uma iniciativa muito válida, tendo em vista que possui uma potência muito grande de fomento à autoestima da população e combate à desfragmentação da cultura negra, principalmente da infância e da juventude negra do município. “O fato de que, para participar do concurso, era necessário se autodeclarar preto e pardo, faz com que crianças e adolescentes sejam estimuladas a se empoderar e quanto pessoa preta”.
“O racismo faz com que a gente negue nossas origens. A beleza negra nunca foi padrão para a sociedade. Portanto, esse concurso surge para reafirmar esse compromisso com a identifade da população negra, contribuindo para a autoafirmação de ser negro, sem que haja vergonha de ser quem é e de expor nossa beleza enquanto população preta”, defendeu Aline.
Para a participante do concurso, Ana Luísa Melo, de 14 anos, o evento dá mais atenção às meninas pretas. “Na minha escola só tem três pessoas de cabelo crespo, então eu me sinto bem em estar aqui, me sinto valorizada e representada. Na escola, as pessoas olham mal para nós três. Essa semana um garoto me perguntou se eu tomei choque [por causa do cabelo]. E não é a primeira vez. Isso dói. Mas esse evento faz com que eu me sinta melhor em ser uma menina preta”, desabafou.
Na avaliação de Cimara Eloi Bastos, representante do EstudioAfro e uma das juradas no certame, na valorização da beleza negra o mais importante é o autoconhecimento. “O meu trabalho no Estúdio, para além de valorizar a beleza preta, consiste também em trazer conhecimento pra homens e mulheres sobre o valor cultural dos nossos antepassados. É por isso que deveria existir mais eventos como esse, porque, embora a maior parte da população seja afrodescendente, a população preta ainda é desprestigiada e desrespeitada. Eventos assim fazem muita diferença para o empoderamento de crianças, jovens e adultos”, afirmou.
Daniela Alves Santos, mãe de Pérola Eduarda, que possui 11 anos e foi vencedora no concurso em uma das categorias, afirmou sentir uma imensa alegria pela ocasião. “Essa é uma felicidade e um orgulho muito grande que du sinto. Esses eventos são muito importantes para valorizar a população preta porque ainda existe muito preconceito. Estou muito alegre, porque, realmente, minha filha é uma negra linda”, disse contente.
O evento contou com as ilustres presenças do prefeito da cidade, Alberto Macedo, e da primeira dama, Suely Macedo, do secretário de Cultura, Diego Araújo, e da secretaria de Assistência Social, Andrea Dória. De acordo com Alberto Macedo, a iniciativa é essencial porque é possível perceber que a autoestima do povo negro vem sendo resgatada aos poucos atualmente e isso não pode parar. “Muito foi conquistado até aqui, mas há uma dívida histórica com a população negra do Brasil. Existe um longo caminho a ser percorrido e valorizar a estética do povo negro é uma das maneiras de trilha-lo”, pontuou.
Sobre a homenageada
A terceira edição do concurso foi realizado em homenagem à Léila Gonzales, uma intelectual, autora, política, professora, filósofa e antropóloga brasileira. Foi pioneira nos estudos sobre Cultura Negra no Brasil e co-fundadora do Instituto de Pesquisas das Culturas Negras do Rio de Janeiro, do Movimento Negro Unificado e do Olodum.
Em seu manifesto, denunciava a falácia do mito da democracia racial e reivindicava o fim da violência e da discriminação sofrida pelos negros cotidianamente, além de exigir políticas públicas em benefício da comunidade afro-brasileira. No Movimento Negro, Lélia chamou atenção também para o sexismo, que muitas vezes impunha ao segmento feminino contínuos processos de silenciamento.
Lélia Gonzalez faleceu no dia 10 de julho de 1994, na cidade do Rio de Janeiro, em decorrência de problemas cardiovasculares. Vinte e cinco anos após a sua morte, o nome e as contribuições teóricas de Lélia Gonzalez transitam entre a invisibilidade acadêmica e tentativas de difusão e afirmação do seu legado, principalmente por parte de pesquisadoras e feministas negras.